segunda-feira, 28 de setembro de 2009

Não-Amor

Toma-me como o ar mais puro:
Inspire,
Respire.

Toma-me como seu vício:
Bebe,
Trague.

Toma-me por sua luxúria:
Respire,
Transpire.

Mas não me tome por seu amor:
Não me deixe,
Não me esqueça,
Não me mate!

Por favor.

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Início

Envolva-me e me faça ser,
fazer, dizer e querer.
Faça do agora o sempre,
torne-se tudo em mim.

Como um traidor, me use;
Como amante, me ame;
Em minhas caídas me segure.
Faça de mim você.

Seja meu complemento,
não seja meu oposto,
esteja disposto, 
pois também posso ser veneno.

Mas, não se irrite,
sou escuro, sou vento, sou tempo.
Inconstante.

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Ensaio de uma Carta de Amor IV

Contei como conheci você, Bernardo. Como estávamos apaixonados, casamos e finalmente conseguimos nossa casa. Brigávamos muito, mas isso já era normal, tirando a última discussão. E nela gaguejei para contar. Você gritava comigo, eu tinha vontade de jogar as coisas no chão, desejei que você morresse e... Não consigo conter minhas lágrimas, perdoe-me. E você saiu. Parei de falar e Daniel pediu para continuar, continuei com as forças que restavam. Entrou no carro e quando estava pronto para ir embora entrei nele. Discutimos ali mesmo, dei-lhe um tapa, perdão por isso; você ligou o carro e ignorava-me enquanto dirigia. Gritei com você, chorei e pedi novamente para que você morresse. Céus, onde eu estava com a cabeça quando pedi tal coisa? Enquanto eu contava, solucei e pus-me a chorar. Daniel segurou minha mão e disse que estava ao meu lado. Olhava-me com ternura e pediu para que continuasse.
Quase não consegui, tremi e minha voz falhava ao explicar que um caminhão avançou o sinal e parecia não parar. Vinha em nossa direção, na direção do carona, que era onde eu estava. Você virou o carro bruscamente e, apesar de todas as coisas horríveis ditas naquele dia, em uma última prova de amor salvou minha vida. Mas eu preferia que não fosse assim, não sabia que por minha vida você pagaria com a sua. Desabei. Contei a Daniel como senti que fui culpada, como você era importante e ainda é. Como me senti quando o conheci, em nosso primeiro beijo e em nossa primeira noite. Abraçou-me e fez-me parar de chorar. Sentia falta disso, de alguém que pudesse fazer-me parar de chorar, alguém que ficasse ao meu lado e me amasse. Alguém como você, alguém como Daniel. Acabei por contar que naquela semana que não dei notícias porque fazia dois anos que você havia partido de minha vida. Daniel pediu perdão, disse que nunca deveria julgar-me e com a mão sobre minha barriga, deu-me um beijo e disse em meu ouvido que no próximo ano ele estaria comigo para conhecer você. Oh, Bernardo! Senti tanta felicidade que não coube em mim. Só pude agradecer a Lorena e contei com apoio de Mariana. Tudo estava dando certo, finalmente.
Hoje estou terminando de escrever esta carta ao seu lado, o cheiro de flores ainda incomoda. Sei que não terei resposta. Quero apenas saber que contei tudo a você. Daniel está lá fora, pedi privacidade enquanto escrevia esta carta. Foi duro lembrar-me de tudo. Sobre a gravidez, é uma linda menina. Atrevo-me a dizer que parece com você. Tem menos de um ano e é muito esperta, demos-lhe o nome de Bianca. Agora ela está na casa de Mariana descansando.
Acho que devo terminar esta carta aqui. Agora tenho que partir. Aquela nossa foto terá uma companheira, as fotos de meu casamento com Daniel estão prontas. Mas não é porque casei que tudo o que você foi para mim será perdido no tempo. Tive sorte de conhecer alguém que não tenha ciúmes deste imenso carinho que sinto por você.


Para sempre sua,
Anne.

terça-feira, 8 de setembro de 2009

Limites

Eu quero que você venha e me desafogue dessa maré de palavras e gritos, quero que você me salve do mundo. Estão todos loucos ! Minhas partes fugiram e não as encontro. Preciso de você para me por o começo e o fim.
Em meio a essa bagunça, me espalho, como a água que agora desce pelo chão a procura de uma barreira para conter seu avanço. Contenha-me ! Faça-me por ordem e ser ordem.
Con-fu-são.
Faça-me sorrir !

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Ausência

Lembro do dia que fui. Fui, não mais sou. Pudera eu retornar àquele estado em que tudo era completo e o nada era tudo. Mas não consigo entender como o tudo se tornou ausência. Ausência que dói, corrói e destrói, como o vento em mim, retirando cada grão, um por um, até eu não ser mais matéria, ser um pouco de tudo e tudo ser um pouco de mim.

terça-feira, 1 de setembro de 2009

Ensaio de uma Carta de Amor III

Tentei contar para você, mas não tive coragem. Sentei e comecei a chorar. Ficar ao seu lado não era tão fácil. Aquele cheiro de flores incomodava um pouco. Não contei e chorei bastante. Você não me abraçou para eu parar e chorei ainda mais.
Fiquei quase um mês sem vê-lo. Era horrível lembrar-me de tudo. Contei para Lorena e Mariana. Sua irmã pareceu ficar desapontada, mas engoliu e conversamos. Elas ajudaram muito. Principalmente quando descobri que estava grávida. Chorei por dias e elas estavam ao meu lado me consolando, mas às vezes Mariana brigava comigo. Um dia discutimos e ela gritava dizendo que eu não te amava ou respeitava, pedi perdão e tentei dizer que nunca planejei isso, eu só queria ficar ao seu lado para sempre, mas... Mariana não compreendia, pediu para que eu saísse, Lorena tentou conversar, foi tão maltratada quanto eu.
Fiz o que pude para reaproximar-se de Mariana, ela evitava encontros e a cada dia que passava parecia odiar-me ainda mais. Tentei novamente conversar, fui até a casa de sua irmã, recebi xingamentos, uma bofetada no lado direito de meu rosto e vi uma de minhas melhores amigas chorar como uma criança. Abraçamo-nos. Ela ainda não havia perdoado, mas começava a entender.
Já não via Daniel há quase dois meses e minha barriga ainda não aparecia. Eu estava no mercado quando o vi. Nossos olhos encontraram-se, mas ele não tinha aquele olhar doce e apaixonado, em seu lugar havia um olhar vazio. Meus olhos encheram d’água e sei que percebeu. No momento que dei um passo em sua direção, ele virou-se e foi embora. Meu coração ficou em minhas mãos, o que eu havia escondido não tinha perdão. Ele tinha ódio e eu não o culpava. Afinal, machuquei muitas pessoas com esse relacionamento. Naquela semana não consegui parar de pensar em nosso encontro e em uma manhã recebi uma ligação. Reconheceria aquela voz em qualquer lugar, era Daniel. Pediu para encontrá-lo no parque de sempre depois do almoço, aceitei em estado de euforia. Meus olhos brilhavam e pensei que as coisas poderiam se resolver. Mas ao mesmo tempo, pensei que poderia ser o fim. Para sempre.
Cheguei ao lugar e ele estava sentado na grama, sentei-me ao seu lado então me olhou profundamente e suspirou. Houve um breve silêncio e este foi quebrado quando ele contou que recebera uma ligação no dia anterior. Lorena ligou dizendo que eu estava grávida e que apenas eu poderia explicar tudo. Minha cabeça estava baixa, quando a levantei vi seus olhos cansados, suas olheiras e todo o seu aspecto triste. Em pensar que eu havia causado isso tudo e, quando era para ele superar tudo o que houve Lorena o destruiu mais um pouco. Começou a falar baixinho que o filho era de meu marido; quando desmenti, ele falou um pouco mais alto. Enquanto eu negava, ele aumentava o tom de voz, então gritou. Desabafou, tirou toda aquela raiva acumulada de dentro de si, xingou-me, chegou ao ponto de quase esbofetear-me e chorou. Eu nunca o tinha visto chorar. Ele sempre pareceu forte e quando eu estava triste, era dele o ombro amigo em que eu chorava. Naquele dia inverteram-se os papéis, fui a consoladora – apesar de,ao mesmo tempo, ser a causadora de toda esta dor. Pedi para acalmar-se porque tudo aquilo, todas as coisas que o faziam ter esta raiva tinham explicação. Pediu-me para eu explicar tudo, disse que seu coração já estava partido e que nada mais poderia machucá-lo. Engoli seco, comecei a falar sabendo que ele talvez duvidasse de cada palavra, apesar de serem todas verdadeiras.